Nas minhas andanças pelo grande oceano virtual da internet buscando entender um pouco mais e melhor os comportamentos digitais dos diversos perfis de pessoas que a frequentam e ajudar a buscar soluções que possam fazer desse ambiente – e consequentemente do real – mais saudável e menos nocivo, esbarro, com certa frequência, em histórias surreais.
Não estou me referindo a golpes, que a cada dia que passa, se renovam, ganham novas roupagens, ou se criam. Mais simples ou mais complexos, envolvendo sentimentos ou apelando para a urgência, o mundo virtual é fértil na criação de possibilidades de tirar dinheiro das vítimas, independente de sua classe social, credo ou status.
Os muitos eus
Em outra linha de análise, porém, é surpreendente – talvez nem tanto assim para os estudiosos da mente humana – como algumas pessoas se transformam radicalmente a partir do momento que ligam seu celular ou computador e entram na internet.
Pessoas pacatas viram algozes vociferantes vomitadoras de absurdos inimagináveis três minutos antes. É como se no momento que se completa a conexão com a internet, abrisse-se uma reestilizada Caixa de Pandora.Pandora, tadinha, com toda a sua meiguice, inteligência e beleza, hoje ficaria ainda mais assustada do que quando sucumbiu à curiosidade e abriu a caixa que lhe foi confiada com a recomendação de nunca ser aberta. Provavelmente, muito mais chocada.
Os muitos eles
Quando os muitos eus são dos outros, são os muitos eles. E os nossos eus não costumam gostar dos muitos eles, dos muitos outros, principalmente quando esses muitos eles não pensam como os nossos diversos eus.
Idiossincrasias à parte, dentre as histórias que mais me chamaram a atenção nos últimos tempos, oriundas de relações na internet, estão aquelas em que alguém se passa por outra pessoa sem um motivo aparente.
Sempre há, eu sei, um motivo. Mas nem sempre os outros eus conseguem identificá-los naqueles outros eles.
Como na história daquela moça que descobriu, ao longo de quatro ou cinco anos (porque várias vítimas amorosas lhe procuraram), que outra pessoa estava utilizando suas fotos das redes sociais para construir relacionamentos a partir de um aplicativo de namoro. Aquele clone virtualusava outro nome, mas montava uma história envolvendo todas as outras pessoas que apareciam nas fotos da verdadeira. Pais, mães, sobrinhos (que ora eram filhos), namorado (que ora era irmão, ora era primo). Um caos.
Ou aquela outra história da jovem que um dia utilizou as fotos da namorada linda de um famoso estrangeiro e criou uma vida paralela. Acabou se envolvendo de verdade, embora virtualmente, com um rapaz, que se apaixonou por ela (ela quem, né?) e como ela igualmente tinha criado um afeto muito grande e não encontrava uma solução que justificasse o que fez, resolveu “sofrer um acidente fatal”. Dias depois de sumir da internet, o “irmão dela” avisou o namorado virtual sobre o “acidente” e ele ficou arrasado. Os dois nunca mais se falaram.
O que justifica tudo isso? Tenho minhas desconfianças, mas deixo a palavra aberta aos psicólogos e sociólogos. Esse comportamento não nasceu com a internet, mas, sem dúvida, cresceu colossalmente com as redes sociais. Onde vamos parar? Tenho minhas desconfianças, mas deixo a palavra aberta a vocês e seus muitos eus.
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